domingo, julho 01, 2007

Estou encharcada desde o momento em que meu corpo deixou de ter contato apenas com o ar que respiro para atingir a dimensão de um líquido. E a água se esparramou por toda a minha superfície de pele.
Concebo agora o que é, por natureza, desfeito. Em mim o palpável bóia. Já não percebo muito do mundo, vejo que gotas espirram para fora de meu corpo. Já não tenho mais o interior e o exterior, tudo é líquido e se apresenta como tal.
O vento me atinge a todo instante e temo e tomo qualquer forma a todo o momento. Penso que ele tem a intenção de me refazer como gente, ele quer ser respirado (ou está só brincando comigo) e não faço idéia de meus desejos.
Se eu cair agora dentro de um emaranhado de água, não serei mais perturbada pela atmosfera humana porque, quando criança, aprendi a nadar e mergulharei bem fundo até tatear algum sólido e me agarrar a ele. Que forma irei obter?
Estou é disforme, pouco me sustento na vertical. Na maioria do tempo locomovo-me feito poça d’água. Meu colchão e meus lençóis amanhecem completamente umedecidos, meu travesseiro também. Nele eu preciso apoiar aquilo que eu considero que seja minha mente, assim posso ter a impressão de que sou ser racional.

Seu eu chorar agora, ninguém vai notar.

Amanhã, quando acordar, quero ser gás para que o mundo possa penetrar em mim com maior facilidade. Quero ser em todos os estados – pois já tenho um anseio! Desta vez não terei forma alguma, não sei se precisarei ter receio de algo, serei seca e imperceptível.
Quando criança, não aprendi a voar. Não quero ser uma gasosa terrestre, será este um problema que terei de enfrentar em meu próximo estágio de existência? Que seja.
O papel está fragilmente molhado, já não posso mais escrever. De nada adiantou ter sido sólida e depois líquida, devo estar brincando com o meu próprio ser. Vou até a piscina, volto a escrever quando gaseificada.

2 comentários:

Babi disse...

"Se eu cair agora dentro de um emaranhado de água, não serei mais perturbada pela atmosfera humana"

Destacada a parte que mais chamou minha atenção. Ultimamente a atmosfera humana me incomoda tanto. Corro, giro, ando, caio, tropeço e permaneço por eras dentro de mim... um pensamento:

adianta interagir e fazer-se, por milionésimas vezes, simpática quando na verdade o que há dentro de você é um vazio sem nome?

Priscila Lopes disse...

Além de escrever belíssima-mente bem, és super criativa, Ju. Adoro que estejas entre nós. Abraços!