quinta-feira, novembro 29, 2007

Borboletas do Espaço em Branco

A Julia Almeida

Jurava que fosse outro dia
e renascia sonho;
in-
...ventava poemas nas tuas palavras,
remendando nós e medos e modos
de sentir.
Mas de vez em quando, ainda,
o teu silêncio:
aproxima-se... não sei tocar.
Enquanto me debruço em teus signos,
tuas mil faces esculpidas em linhas,
eu a espero se manifestar – em mim.

Soam sinos – e tuas aSaS
............sobre
.....................voam
..............................borboletas
(herbívoras, devoram o papel)

A ti exponho meu desdentro, in-
verto lágrimas - é o corpo do poema
que me excita, é a sua liquidez
que me embriaga.

O teu olhar espetou minha escrita
e jorrou tinta vermelha
(bandeira branca do poema,
asteia!),
a ponta que penetra, exterioriza
toda vontade de dor, cega.

Curto com vergonha #00 (Pirassununga 51 e cansaço)

Um verso, impresso eu teu sexo:

Entre tua saia, saia meu universo.

quarta-feira, novembro 28, 2007

um pouco sobre TP

caos é o choque de realidades
realidade contida em cada pessoa
o terror não acontece sem caos
poesia é a tática pra uma vida mais...
coerente
torrerismo poético pra uma vida...
mais coração, e menos engrenagem


[+] http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/12/296700.shtml

terça-feira, novembro 27, 2007

Água Fria (ruim, Sem título #03)

Água Fria

Na carne, o pesado
soco inteiro...
e o corpo se desfaz
minado lentamente...

E o corpo é uma dádiva.
E a vida é uma dúvida.

Os nervos vão lentamente,
com a sabedoria de uma crueldade lenta,
namorando a paz:
A dor é um gozo profundo,
os nervos, não lhes restam dúvidas...

A vida é uma dádiva.
O corpo é uma dúvida.

E tudo o mais, toda a dor um encanto...

A dúvida é uma dádiva.
A dádiva , uma dúvida.

Pela carne
a pele, a câimbra...
a calma é uma ilusão
e não há mais nada.
O riso e o gozo são
dor e o choro.
Não há tato,
Não há toque.

E os olhos fechados
Pela noite escura
Sentem a água fria...

Tomando conta do mundo
Eu existo encantado por poder.

Como uma gentileza do universo em minha direção,
eu sinto o frio e o frio me faz deixar de sentir a ternura,
nada mais existe.

É tudo luminoso.

Na solidão de despir-se
no oceano noturno,
os olhos fechados,
bela noite escura,
sentem a água fria...

Curto sem-vergonha #23 (Uísque J.B. e saudades)

Um verso, no verso da sua saia:
Saia sua saia, entre meu universo.

sexta-feira, novembro 23, 2007

Teia Tela Ela

Ela quer morrer, pois acredita que encontrará Caravaggio. Passa os dias pensando em telas. Para ela, o trabalho de um pintor equivale ao ofício de uma aranha. Arte de quem sabe usar as mãos costurando modos de viver flutuantes. Por entre as teias que balançam quase soltas no ar, dá pra ver o mundo em volta cortado por linha finas que o fazem mais dançante. Menos precário também fica o mundo quando em tela, pinceladas das fantasias humanas não mais escondidas.

Nem tela nem teia ousam encostar em chão.

Pensa que vai encontrá-lo pintando sobre uma imensa teia de aranha que costumam chamar de céu, então morre em pedaços. Já despiu-se toda e tem cortado fragmentos de pele. Quer perder pedaços pra não correr o risco de romper a teia. Quer perder-se toda deste mundo, aos poucos, da maneira que pode. Nunca ousou pintar. Imagina Caravaggio colorindo a teia em que ela deseja deitar para ser pintada por ele. Pensa que seu modo de viver é tão chão. Amanhã deixará de comer.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Entre a vitrine e o estoque - Memórias de uma vendedora de shopping

Capítulo 21 - Palestra (des)motivacional

Hoje tivemos que ir para o [outro shopping], participar de uma reunião, não disseram exatamente de quê.
Encontrei a [vendedora xis] no hall do elevador, fomos juntas para o décimo sexto andar.
Era uma palestra motivacional. É foda ser obrigado a ficar ouvindo um babaca falando sobre vestir a camisa da empresa quando se trabalha em uma loja. Essa merda de empresa jamais veste a minha camisa. E cobra pela dela - só tenho 50% de desconto nas roupas que sou obrigada a comprar para usar enquanto trabalho.
O discurso de hoje incluia pérolas como "você tem que investir na sua imagem. Como vai vender uma blusinha fashion pra cliente se você está de regatinha básica? Precisa ter as mais elaboradas também!". É a loja que paga a merda da blusinha?
Outra: não é legal pegar as coisas e sair no minuto exato em que acaba seu horário se você perceber que a loja está com movimento e seus colegas precisando de ajuda. Tem que ter um sentimento de equipe, uma solidariedade.
Quantas vezes a loja teve uma postura solidária quando precisei? Quando fiquei de exame na faculdade não pude sair mais cedo pra estudar. Tive cólica num domingo e saí mais cedo. Contaram como folga.
E hoje, então? Duas horas nessa palestra ridícula sobre métodos de venda e eu ainda tenho que fazer meu horário normal na loja. Duas preciosas horas da minha vida jogadas fora.
Eu só não mando a tiazinha do RH à merda porque sei que esse é só o papel que ela tem que cumprir. O trabalho dela é falar bosta pra gente. O nosso é vender calça skinny pra mulher gorda.
No fim do mês, cada um ganha seu salário, paga suas contas e pronto.

Atropelamento

Chegou mancando, adentrou na sala do Doutor. A cada passo, segurava um gemido, mas era forte e resistente. Sala de espera...

Espera,
espera,
espera,

- Senhor Gonçalves! - chamou a secretária - Pode entrar. O Doutor o aguarda na sala ao lado.

Agradeceu, como faria qualquer pessoa menos educada diante de tamanha simpatia. Levantou-se calmamente e andou coxo em direção à tal sala. Abriu a porta já foi entrando, mancando um pouco mais acentuadamente - como quando se está com vontade de ir ao banheiro e, à medida que se aproxima do urinol, a vontade cresce. Sentou-se. O Doutor palitava os dentes, estava meio sujo, umas manchas pretas na roupa azul, barba por fazer. Até aí, normal.

- Vamos ver, vamos ver, senhor...senhor...

-Gonçalves. Senhor Gonçalves - remendou.

- Era isso que eu queria dizer. Então, Senhor Gonçalves, conte-me o que passa na sua perna.

- Então, doutor. Eu estava caminhando na calçada, mas o trânsito era tanto que as motos cortavam por ela, e aí uma delas me atingiu. Acho que soltaram algumas peças.

- Hummm, nada que um apertozinho não resolva.

Pegou a chave, a graxa, o óleo, e puxou papo com o paciente enquanto atarrachava:

-Correria hoje né, estou fazendo jornada de 20 horas, comprei aquele sistema de injeção eletrônica de alimentação que resolveu meu problema. Agora posso atender muito mais gente. Parece que esse mundo não para de evoluir, né?

- Não sei não, viu, Doutor! Eu tenho um humano em casa que, esses dias, deu maior trabalheira. Estava com uma tal de doença do mundo. O mecânico disse que era um tal de estress.

quarta-feira, novembro 21, 2007

isso que tu olhas,

intrigada,

e pensas ser apenas

um grande gogó,

nada mais é

do que a poesia

entalada na minha

G

A

R

G

A

N

T

A

terça-feira, novembro 20, 2007

Entre a vitrine e o estoque - Memórias de uma vendedora de shopping

Capítulo 12
Ainda sem título

Fui até o canto mais escuro do estoque, apoiei a cabeça sobre a mão, fechei os olhos.
"Força!". Tanta loja naquele shopping e a mina dele tinha que querer vir comprar aqui?
Rolou aquele encontro tenso de olhares quando meu ex entrou na loja. Não nos cumprimentamos. O [vendedor] atendeu os dois e eles foram para o outro canto da loja.
Eu estava atendendo um outro cara. Continuei sorrindo, sendo simpática, mostrando roupas.
Por dentro, morrendo de vontade de sair correndo dali.
Não nos víamos há pelo menos mais de um ano, desde que terminamos. Quer dizer, vamos ser sinceros. Ele que terminou comigo, num dos útlimos dias de aula. Na formatura, já estava com outra.
Nunca mais conversamos. Quando a namorada dele entrou no provador, ele veio em minha direção. Não, eu não estava preparada. Ia acabar amolecendo, chorando ou perdendo a compostura no meio do expediente. Ele não merecia. Ainda mais porque era aquela piranha que ia sair com ele dali.
Falei pro meu cliente que ia buscar uma camiseta legal pra combinar e corri pro estoque.
Até que enrolei bastante, mas quando saí, dei de cara ele. Todo sem graça, me pediu pra avisar o [vendedor], que tinha entrado no estoque, para trazer uma calça tamanho 36 pra ela - a 38 ficou sobrando na cintura. Eu sou manequim 40. Não que eu me ache gorda, mas é sempre ruim saber que você foi trocada por alguém mais magra.
A tortura durou mais uns 40 minutos. Ela, que parecia não saber quem eu era (ou tinha sido), ficou pedindo a minha opinião. Fiz o que pude pra ela decidir logo por um modelo (o mais caro) e sair logo dali.

Dois dias depois, o [ex] voltou aqui. Dessa vez, me chamou pelo nome. Pedi uma pausa pra fumar e fui conversar com ele.
"Desde quando você fuma?".
Eu sabia que ele detestava, então fiz questão de acender um cigarro - e até de fumar.
"O que você quer?"
"Foi estranho te reencontrar depois de tanto tempo... Você tá diferente..". Fez aquela carinha de bom-moço do início do namoro.
"Pensei que a gente podia sair um dia desses, comer uma pizza, conversar melhor". Tentou passar a mão no meu cabelo.
Cachorro.
"Qual o nome dela?"
"[nome]. A gente não tá..."
"Ela sabe que você tá aqui?"
"Não, quer dizer, eu tava por aqui e daí resolvi passar na loja.."
Desencostei do murinho, apaguei o cigarro.
"Que foi? Peraí...".
"Se você quer foder com ela como fez comigo, o problema é seu. Só não me envolva nisso".
"[protagonista]"
Com o coração disparado, surpresa pela minha própria frieza, saí andando, as fortes pisadas do salto no mármore do chão me dando orgulho de mim mesma.

quinta-feira, novembro 15, 2007

a quintessência

da indecência

está na mente

de quem sente

se indecente

1

isso todo mundo sente

In-consciente-mente.

1

a quintessência do

indecente

é inocente

e não sente

nem senta

nem suja

nem sabe

nem culpa

nem pede desculpa.

1

a quintessência

da inocência

anestesia.

1

pena que ela esta perdida.

1

já decupei toda minha vida

em busca dela, está perdida!

só compliquei!

decupliquei toda minha culpa.

1

***

1

a quintessência está tão longe!

1

não consegui chegar nem na primeira...

quarta-feira, novembro 14, 2007

De natureza etérea [v1.5]

No perfume das rosas, na presença plantada em um lugar comum, trilhas de saudade. Quanto de vida nossos olhos não conseguem enxergar?

Arbustos de cinzas nos tornam cegos, no tempo que polinizam contradições a cada lufada de vento, em cada instante de vida - maratonas pelo lugar ao sol e nosso falho projeto, só porque nunca alcançaremos a altura da perfeição, sempre lembrados de nossa condição humana. Nosso karma no paraíso, nossa possibilidade: descobrir que podemos enxergar e fazer além do pó, e que podemos encontrar falhas até mesmo na cor - a beleza continua nos olhos de quem vê.

O tédio azul-céu de um blues pode prenunciar tormenta de fogo no dia seguinte: a colheita, o azul-vermelho de um tango acelera o coração. Tons que sublimam comovem os olhos, tomam os pulmões para a imersão do momento - noite escura num palco floresta, e a lua dourada refletindo em seu riso tímido de um segredo quase desvendado. Música.

Mais fácil é distinguir quente do frio, uma mesma palavra tem diversas temperaturas: na ternura de um mimo, lírio, ou aspereza de uma repreensão. O elemento principal de qualquer palavra pronunciada (o anunciante da estação), crava a devida atenção nos interlocutores - resultado de beleza... ou poder. Daninha, palavra enganadora, cresce em quem cultivar, alimentada por uma raíz plantada em dois ou mais corações. O ódio absorve calor do ambiente, da Terra, e acumula-o nos olhos, o ódio ruge na voz, ferve o sangue e cerra olhos, dentes e punhos - pronto, enxergamos em vermelho-sangue, e a grama alheia só importa ao vizinho. De raízes fundas também é qualquer semente germinada em contato casual - e toda raíz arrancada, galho quebrado é dor na terra.

Um buquê de rosas, seu perfume é a presença autenticada, maior que seu tamanho poderia inaugurar. O que os olhos desta vez não conseguem ver, e mesmo assim acabam em memórias, mais acreeditamos nesses laços invisíveis, que insistem em não desatar. Cetim.

[co-escrito com Thaís Ferraz]

terça-feira, novembro 13, 2007

ambígua idade

Ainda que eu escrevesse um poema por dia
ao longo do ano
não escreveria tanto quanto hoje
que me sinto triste
e sem vontade de escrever.

sábado, novembro 10, 2007

Mulheres da vida

Feliz é o homem cuja existência está delimitada por duas mulheres: a mãe, que lhe dá a vida, e a amante, pela qual ele padece e morre.

quinta-feira, novembro 08, 2007

Entre a vitrine e o estoque - Memórias de uma vendedora de shopping

Capítulo 5
Não-fumantes que fumam

Odeio fumar. Demais. Não vejo graça nenhuma ficar no meio daquela fumaça, infestando meu cabelo, minhas roupas. Sinto como se estivesse enfiando um escapamento na boca.
Eu não fumava antes da loja. Aí percebi que os fumantes sempre tiram um intervalo de uns quinze minutos no meio do dia pra acender um cigarro. Tentei sair pra "tomar um ar fresco" outro dia e tomei um come. A loja tava cheia, aquela playboyzada olhando, olhando sem comprar. Ar fresco não é vício, não merece intervalo, "se não tem o que fazer, vai baixar estoque".
E os colegas espairecendo à vontade no meio da fumaça. Então foda-se. Decidi que, pra eles, eu fumo. Acabei de entrar nessa loja, esse papo ainda cola; além do que, nunca mencionei nada a respeito antes. A [colega-amiga], que fuma de verdade, costuma sair comigo pra me dar cobertura.
Tenho três maços na bolsa. Um eu comprei, o resto peguei usado dela. Um do câncer, com aquele cara da perna amputada, o da impotência, que tem um cigarro com cinzas caídas sugerindo uma broxada, e o da menina asmática. Esse último me incomoda um pouco, mas é melhor que o dos ratos. Fico dividindo o conteúdo entre eles, levo o mesmo durante uns dias.
De vez em quando, dá merda. Outro dia, encontrei o [gerente] numa dessas escapadas. Eu tava sem a [colega-amiga], tive só tempo de acender um cigarro, dar um trago muito a contragosto e ele chegou.
"Opa. Isqueiro?". Emprestei o meu para ele acender o dele. Ele começou a fumar normalmente e eu fiquei desesperada, sem saber o que fazer. Dei mais dois tragos e deixei cair, fingindo um acidente. "Merda". Ele ofereceu outro. "Não, deixa quieto. Já era o segundo... Melhor ir com calma, to querendo desapegar. Vou dar um pulo no banheiro e depois volto pra loja".
Lavei minha boca, as mãos fedidas de tabaco, o rosto cansado. Olhei-me no espelho e mentalizei: "coragem, nega./ Só faltam R$ 870 pra bater a meta de hoje". Eram 17h40 ainda.

terça-feira, novembro 06, 2007

D-evolução

Refletida

Na vitrine da loja

Enxergo novamente

Minha face cansada

1

Até que sou bonito (!), apesar do desânimo.

Até que sou esperto (!), apesar da preguiça.

Até que sou bacana (!), apesar da arrogância.

1

Por que será que eu tenho de-vir com defeito de fabricação?

sábado, novembro 03, 2007

Múltiplos eus - ou apenas segredos

Pessoas que são mais de uma pessoa, aquela que parece de um jeito num lugar e de outro em outro lugar. Serão máscaras sociais? Múltiplas personalidades?

Pessoa tinha heterônimos - será que Pessoa sofria de transtorno dissociativo de personalidade, e a personalidade que mantinha o controle sobre as outras era o de nome Fernando? Não sei, não quero colocar isso no Google também, gênio é gênio, não se discute [John Forbes Nash Jr., esquizofrênico ganhou Nobel de Economia[1]].

Um pouco de darwinismo social então: o mais forte sobrevive - frase errada, o mais adaptado sobrevive, não a toa a vingança dos nerds está sendo cada dia mais devastadora - indústria da música, cinema, games, e hoje todo cidadão médio depende de computador. Eles criaram um ambiente onde eles fossem mais fortes, e porque criaram isso? Porque são nerds, eles pensaram pra fazer!
A aceitação é maior, e agora os valentões precisam fingir ser nerds também. Máscaras sociais para enfrentar o dia-a-dia de uma escola, de uma família, no trabalho - numa empresa acho dificil descobrir qual a identidade secreta do verdadeiro puxa-saco, será sempre a mesma resposta: eu não sou puxa-saco, mas conheço um!

Tudo bem, eu escrevendo e eu falando são caras totalmente diferentes, ou não? Sim e não, se fosse outra pessoa escrevendo não seria eu, seria outra pessoa, criando outra para escrever - esse negócio de recursão existencial já rendeu muitos textos [2]. Nunca conheceremos outra pessoa totalmente, nem a nós mesmos. Todos temos nossos segredos, uns sabem de alguns, outros sabem de muitos, tem os que não precisam saber nenhum, a sinceridade não está no tamanho do segredo, está no tamanho do sentimento.

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/John_Forbes_Nash
[2] http://sindicatodosescritoresbaratos.blogspot.com/2007/07/16-parte-2-vontade-de-ser-deus.html [comentário de Diogo Lyra - tentei localizar link direto, mas não achei]