terça-feira, julho 31, 2007

Somos chamas?

Dilemas de poder e fé. Negociar dinheiro, confiança e tempo. Um baile entre temores e desejos. Buscar a felicidade. Amar. O drama humano.

O drama humano, é essa nossa natureza? A natureza humana, dor e esforço? Tanto quanto se debater por qualquer sinal de ameaça à nossa existência, que pode chegar a uma sobrevida sufocante, que por fim ameaça, e nos faz debatermo-nos de novo.

Vícios e ilusões.
O equilíbrio libertador - muito parado.
A tormenta de cada respiração - espinhos psicológicos caóticos e auto-destruidores demais. Transcender, vencer, mediocridade, equilíbrio. Só nos deram uma possibilidade: experimentar.

Basta experimentar, utilizar a única ferramenta disponível para interagir com a realidade: nossos corpos.
Gritos, palavras, tinta no dedo, batuque com as mãos, bolhas de sabão, silêncio intimidador, girar a si e aos outros. Começar tudo, terminar se valer a pena, se a alma não for pequena.

O amor sempre vence - dependendo da versão da história. Nossa sina, nosso karma - viver. Onde extinguimos nosso ego, assinamos na História.

domingo, julho 29, 2007

Ana Cíclica

Ana Cíclica
é mais ou menos
(ou quase)
anacíclica,
raramente perfeita.

De quando em quando, vira uma arara.

Ana arara

Mas quando esvazia o osso melhora

Osso oco

É preciso sempre reler Ana. Reler e rir.

Reler Ana e rir

Poucas vezes fica muito
anacíclica.
(embora ainda confusa)

Nessas vezes chega em casa, olha o gato e diz, feliz

Olá, galo!

Minha Ana.

Ana Cíclica,
quantos anos?

Ana rama
Ana mora
amor raro
Ana amora
Ana Mara

Mariana, Juliana, Fabiana, Fulana, Bela, Isabela, Clarabela...

Ana Clara.

Vermelha. Clara. Vermelha. Clara. Vermelha. Clara. Vermelha.

Clarabóia.

Ana Cíclica.

A viva Ana!

Ave, Ana: a Diva!

Ave, Ana: Eva, Vida .

Ave, Ana: voa viva.

quinta-feira, julho 26, 2007

Praga - Parte 2 de 4

No dia da festa os três pareciam empolgados, cada um a sua maneira. Como estavam terminando o colegial, ao contrário do que praguejara Juvêncio, agora quando bêbados falavam:

- Fooooooooooda-se: o Juvêncio!

Fernando e Fred se encontraram no Terminal Capelinha e seguiram juntos até a casa de Tico, de onde partiriam para o clube localizado a beira da represa, no extremo sul da megalópole. Fazia um frio glacial. Fernando estava ansioso, mas meio cabisbaixo, o olhar tristonho logo abaixo da toca preta. Sua namorada tinha terminado com ele e já estava com outro. Já Fred e Tico estavam extasiados, querendo comemorar a vitória sobre a descrença dos professores, dos coroas e do Juvêncio. Bem vestidos, cheirosos, as cabeças fervilhando, foram bebendo latas de cerveja morna e cantando, cada um com seu plano para a festa que viria.


Festa boa. Em pouco tempo Fernando já tinha esquecido seu primeiro trauma amoroso auxiliado por várias latas de cerveja, alguns copos de batidas adocicadas e, principalmente, por Carlinha, um antigo sonho que ele nunca se julgara capaz de realizar. Já Fred não tinha sonhos, tinha metas. Na metade da noite, juntou os outros dois camaradas para anunciar, orgulhoso:

- Galera, o bagulho ta loco, já catei cinco!
- Ta bom Fred, legal.
- To falando mano!
- Não liga pra ele não, Carlinha.

Tico parecia normal, embora um pouco quieto, mas por dentro estava agitado. Tinha planos secretos na cabeça. Sentia-se meio entediado

- Aí Fred, sei lá, tenho pensado numa coisa... To meio cansado desse bagulho de balada, de ficar com várias minas... Tá ligado? Sei lá, não sei explicar.... Elas não ficam comigo, sacou? Elas ficam com a casca...
- Caralho mano, que boiolice! - respondeu Fernando, caindo na gargalhada - Cansou de mulher?
- Para de zueira velho, to falando sério. Enche a cara, pega mina, vomita, enche a cara, pega mina, vomita... Isso tudo me parece tão vazio... Não é só isso. essa vida, essa escola, esse bairro, minha família, esse mundo... é tudo uma merda! Tudo é muito vazio...
- Ai, que dor... Como eu to triste... Quer saber? Por mim tudo bem, sobra mais mina pra mim.
- Você é idiota pra caralho, né? Queria encontrar uma mina pra mim...
- "Queria encontrar uma mina pra mim, queria encontrar uma mina pra mim, elas ficam só com a casca, é tudo vazio, ó dia, ó noite, ó céus, ó vida, blá , blá ,blá..." . Blá, blá, blá, entendeu? Isso aí é blá, blá, blá. Toma um gole dessa breja aí e cala a boca, ô cascudo! Ou parou de beber também, bichona?

e há tempos que uma menina parecia ser a resposta para curá-lo desse sentimento. Pelo menos por algum tempo. O único problema era o namorado dela, o Rafael. Molequinho marrento, pose de skatista, andava sempre com um boné enterrado na cabeça, fazendo cara de poucos amigos, desfilando com a pequena Débora como se fosse seu maior troféu. Tico se indignava.

- Se liga Nando: como pode uma flor dessas na mão de um cabaço como esse cara?
- Se liga você, Tico, que esse moleque aí é meio embaçado, já ouvi umas histórias meio bizarras sobre ele...
- Então truta, é disso que eu to falando! Olha só, que princesa! Esse olhar terno, cabelinho curto, sorriso meigo, tão baixinha, tão magrinha, tem cara de ser inteligente... Como pode? Com um babaca desses! Deixa esse cara vacilar.

Tico encasquetou, não havia jeito de tirar Débora de sua cabeça. A seu favor contou a idiotice de seu oponente. As três da manha Rafael deixou a pequena Débora na festa para ir à outra festa com seus amigos, botar mais um chifre na namorada e encher a cara de pinga e cocaína. Talvez fossem pro puteiro. Tico observava discretamente os dois. Após Rafael sair, ficou por um tempo olhando Débora lá, sozinha, sentada em um canto, tentando ligar para os pais do celular que não pegava. Era tão linda! O cabelo castanho claro meio liso, meio ondulado, curtinho, caindo nos olhos calmos, muito calmos. Aquela tristeza tão calma... Aquela saia curta, tinha pernas lindas! Achou que ia ter ciúme se ela virasse sua namorada. Namorada? Como assim. Namorada? Pensou por mais alguns segundos e decidiu. Foi até ela, levou um copo de refrigerante e uns brigadeiros. Conversaram até o sol nascer. Assistiram ao espetáculo lado a lado, afastados da festa, sentados em cima de um pequeno morro a beira da represa, mantendo, respeitosamente, uma pequena distância. Às vezes as mãos se tocavam e Tico corava, envergonhado, de um jeito que nunca ficara antes, parecia que ia encolher até chegar ao tamanho de uma joaninha. Era angustiante, mas era bom... O calor daquela mão pequena, tão raro, fugaz, homeopático, fazia desaparecer o corte daquele vento tão gelado. Ficava segundos sem prosseguir a conversa, gaguejava, esquecia o que estava falando. “Estou parecendo o Nando!”, pensou.


Tico deixou primeiro os dois camaradas e Carlinha em suas respectivas casas. Olhou para Débora e decretou:

- Agora eu vou te levar pra casa, mas antes a gente vai fazer uma coisinha.
- Como assim? Tico, olha lá, eu tenho namorado, meu pai já deve ta bravo...
- Relaxa mina. Você vai gostar.

Foram a uma pequena praça no bairro dele aonde compraram dois sorvetes baratos para cada um, desses que são feitos em máquinas engraçadas com várias garrafas de “suco” espetadas. Sentaram a sombra de um ipê roxo, juntaram suas últimas moedas, compraram um saco de pipocas e ficaram lá, conversando mais um pouco sobre suas vidas vazias. “Agora não me parece tão vazia” pensou Tico. O tédio dele realmente estava passando e algo a mais que isso estava acontecendo. Não demorou muito e Tico olhou para ela diferente, pensando que era aquela a hora, aquela ou nenhuma, tinha que arrumar um jeito de arrancar um beijo daquela menina.

- Olha Débora, vou te falar uma coisa, de coração... Err... O seu joelho... Bem... É o mais lindo que eu já vi na minha vida!
- O que? – disse Débora, olhando automaticamente para o joelho, estupefata.

Tico a beijou. Ela fez que ia resistir, virou o rosto, pediu para não ser tentada, mas acabou se entregando aos poucos. Beijaram-se, misturando álcool, tabaco, hortelã, chocolate, sal, medos e sonhos. Fecharam os olhos e no escuro se sentiram iluminados. De olhos fechados saíram da praça flutuando suavemente, tão leves (!), como plumas que caem para cima. Flutuaram, flutuaram e flutuaram e a lua foi apenas a primeira parada. Flutuaram como flutuam os amores verdadeiros enquanto se concebem.

Vermelha dor vertida

Eu não sabia ser quem eu era, sem encontrar o limite mais profundo de uma agulha, me feria vermelhamente.
Eu não sabia ser quem eu era, pousei a agulha sobre meus seios, fiz deles minhas mãos. Do objeto, cada ponta equilibrava-se nos pedaços daqueles enchaços de pele, que então se comunicavam. Quando solucei, o limite mais fino me invadiu, me feri vermelhamente.
Eu não sabia ser quem eu era, verticalmente e sem respirar, coloquei a agulha em meu umbigo. Segundo ilusórios, ela quedou para formar 30 graus com a superfície de pele mais próxima, minha barriga. Então insisti, um de meus dedos a manteve de pé, era outra passarela, agora forjada, mas sangrei verdadeiramente, me feri.
Eu não sabia ser quem eu era e ela deslizou com seu próprio peso por toda a minha perna esquerda. Não sei quem escorregava mais depressa, se ela ou meu vermelho escuro. Sei que pinguei e a agulha se banhou em gotas disformes. Minha mão direita, no chão, sentia o líquido morno quando a encontrou, estava ainda toda prateada... Me feri vermelhamente sem saber quem eu era.
Eu não sabia ser quem eu era, com o corpo perfurado a encostei em minha pálpebra esquerda, a minha pele mais fina a sustentou, por instantes. Não me feri. Tudo estava seco e, estéril, eu quase desfaleci.
Abruptamente enfiei a agulha dentro de meu olho esquerdo para depois fazer o mesmo com o direito. Me feri vermelha e cegamente. Então eu sabia ser quem eu era. E não vi mais o objeto, tão pouco pude constatar o meu sangue com a minha visão. Me feri vermelhamente enquanto descobria ser quem eu era: toda vontade de dor, cega.

(eu)Era e me criava em vermelha dor vertida.

quarta-feira, julho 25, 2007

Praga - Parte 1 de 4

- Você vai fumar um cigarro aqui?
- Claro, to com a maior vontade. Ta de boa, não tem ninguém aqui.
- Deixa ele. Eu não to fumando cigarro nenhum.
- Cara, a gente já ta cabulando a missa. Se pegarem a gente aqui com você fumando, é suspensão pros três.

Fernando não conseguia esconder seu medo de ser pego, mas que merda! Precisava esconder. Foi nerd por tempo demais e gozava finalmente de mais respeito com seus colegas por ter batido em um moleque folgado do segundo colegial – bater em um menino que está uma série a frente é sempre uma proeza admirável. Além disso, finalmente arrumou uma namorada e não se sentia mais atrasado com relação ao resto da turma. O colegial era uma nova era para ele. Já Fred até que tinha se virado bem um pouco mais cedo. Não era o mais popular, tudo bem, mas tinha transito livre entre as turmas mais descoladas do colégio. Nada que se comparasse ao que Tico tinha. Era o bonitinho, menino alto, fortinho e de bochechas rosadas, cabelos loiros divididos ao meio, parecia saído de um filme de sessão da tarde. Ficava com as meninas mais lindas, tinha amigos bem mais velhos, fumava, bebia, andava de carro e voltava pra casa bem depois da meia noite. Sempre! Fernando e Fred até davam suas escapadas.

- Mãe, vou dormir na casa do Fred, os pais deles viajaram, tudo bem?

- Aí mãe, posso dormir na casa do Nando, parece que os pais dele vão viajar e a mãe dele falou pra ele chamar um amigo.

Caíam na farra, compravam um galão de vinho barato e não tomavam quase nada. Ficavam completamente bêbados. Iam aos shows das bandas que ouviam no rádio e juntavam alguns trocados para entrar vez ou outra nas baladas da moda, mas tinham dificuldades com as meninas e não poucas vezes saiam sem ficar com ninguém, muitas vezes inventando estórias sobre os longos momentos em que desapareciam para “caçar”. Não era o caso de Tico, claro. Vinha e voltava quando queria. Aonde ia, arrumava uma menina. Não era apenas a beleza. Era arrogante na medida certa para conquistar os corações das colegiais.

- Aí galera, como é que a gente diz em uma hora dessas?
- Para com isso Tico, eu já tenho duas suspensões, a dona Raimunda não vai com a minha cara!
- Deixa disso, Fê! Ta todo mundo na missa agora, cê acha que essas velha carola vão perder a pregação do corcunda de Notre Dame? O Tico tem razão, a escola é nossa!
- E então, como é que se fala?
- Ta bom, mano, ta bom.
- Fooooooooda-se! – disseram os três em uníssono.

Mas tinha o Juvêncio. Homem baixo, troncudo, cabelo castanho claro bem despenteado, bigode vasto. Parecia um famoso ator de filmes policiais e por isso todos o chamavam de Charles. Juvêncio os observou do prédio por vários minutos, como um chacal esperando que eles mesmos fossem até ele. Quando o resto da escola voltava da missa e os meninos se apressaram em se juntar sorrateiramente a massa para pegar as mochilas na sala de aula, Juvêncio já estava no pátio, à porta do prédio, esperando com cara de paisagem. Os três passaram como se nada tivesse acontecido, mas Juvêncio os deteve rispidamente.

- Vocês três aí, vem comigo e depois vocês pegam suas mochilas.
- Qual é Chales? Ta com desejo de matar?
- Eu vi vocês ali da janela, tava só esperando você terminar seu cigarro e vir pra cá. Vamos, pra diretoria.
- Que isso Charles? A gente tava rezando lá.
- Valeu por me deixar terminar. Você é fumante também?
- Aí, qual é a de vocês? Vocês tão achando o que? Pivetes! Querem saber de uma coisa? Vocês não vão ser nada na vida. Se bobear, nem entrar na faculdade vocês vão conseguir. Nem essa bosta desse colegial vocês vão conseguir terminar. Nada. Vocês vão é se ferrar, isso sim!
- É. Aí só vai restar virar bedel de escola.
- É o meu destino.
- Pode crer.

terça-feira, julho 24, 2007

poesia é vida
e a vida está lá fora.
estou aqui dentro,
catando migalhas.

aqui dentro... de mim
bem dentro de mim
catando migalhas...
migalhas minhas.

Justificativa

Talvez eu esteja adiantada.
Haverá o dia em que lerão minhas palavras,
mas hoje não:
silêncio, e amarga
a boca o café
preto como a visão nublada
de um crítico.
É o caso de Cruz e Sousa
que quando morto,
esteve mais vivo.

segunda-feira, julho 23, 2007

Alicerces

Uma vez me disseram que é só quando você cresce que consegue perceber certas coisas. Eu digo perceber, e não apenas ver, porque perceber é muito além de ver; é condoreiro e seleto ao mesmo tempo; é sentir e dizer; é inconstitucional, inconsciente e inerente a qualquer tipo de intempérie. Uma vez me disseram que só quando se chega à tenra idade é que se pode perceber quem são seus amigos. Só quando se atinge a maturidade fraterna que se percebe que os guerreiros que lutam do seu lado da trincheira são os que - mesmo não se preocupando com você em alguns momentos, por ter, nestes curtos espaços de tempo e espaço, alguma preocupação que apenas lhes dizem respeito, que são pessoais - sabem que você está lá, ligam para dar um "alô", e são dignos de seu amor incondicional e eterna gratidão por suportarem suas dores.
E uma vez me disseram que uma das pistas da verdadeira amizade é aquele momento em que você e seu amigo estão fumando um cigarro, cada um pensando nas suas coisas, cada um preocupado com suas preocupações, onde nenhum som pode ser ouvido por um intervalo de tempo sem um valor fixo por nenhum dos dois interlocutores, não há constrangimento. E você acaba primeiro o seu cigarro e cede o cinzeiro para que termine o dele.
Hoje creio ter chegado à tenra idade. Me disseram que, no futuro, eu poderia contar nos dedos quem seriam meus verdadeiros amigos, e hoje vejo que tudo o que disseram é como uma espécie de dogma da amizade. Espero conhecer pelo menos mais alguns para completar a mão que falta.

Amo vocês, meus amigos.

[16 - parte 3] A lei do mais forte

Os fortes sobrevivem e os fracos morrem, comecei a ouvir isso depois dos 12 e comecei a perceber melhor aos 14. O medo de ser fraco, de não derramar lágrimas e de não sofrer.

O último a ser escolhido pro time de futebol. Tudo bem, faltou vontade, mas a cada excluída a chama queimava e se manifestava, a rebeldia pode nascer cedo, uns mostraram como lutar em frente ao portão da escola, na hora da saída, e em casa a defender sua honra acima de tudo.

A raiva passou depois de testes com a própria personalidade. Sim! podemos ser o que quisermos! Receita: foça de vontade e algum sentimento forte para mantê-la, e a força juvenil está cheio deles: a garota da escola, ódio, revolta, amigos, liberdade.

Ser forte. Depois de ouvir Darwin na escola, de que só os mais fortes sobrevivem, a frase tem falhas, pois se fosse assim, nós só viveríamos até a hora do recreio, ou da saída.

Maria

Eu e a Maria
Eu amaria
Como recitar uma poesia

Amargaria
Ao mar daria todo o meu penar
Todo me entregaria

Minh´alma daria a ti
Se sinhá mandaria eu vir a ti

Entre minha alegria
Entra em mim agonia
Em ti, sim, há poesia
Para que ainda haja um samba
Pra uma tal de Maria

Entre minha alegria
Entra em mim agonia
Em ti há sentimento
Para que haja algum momento
Que, pra mim, seja dia

domingo, julho 22, 2007

Quero um canto
para cantar.

Quero um canto
para descansar.

Quero um canto
para de cantar!

Quero um conto,
quero um desconto,
quero cor.

Queria, não quero.
Queria não, quero.

Quero tudo,
quero nada,
o que sou?
Quantos sou?
Daqueles que sou,
quantos são?
Quantos querem?
O que querem?
Quantos sãos?

sexta-feira, julho 20, 2007

Requinte


Afirmaram: "a repetição
leva à perfeição".

É fato.

Tenho errado cada vez mais
e melhor.

quarta-feira, julho 18, 2007

É oca a Terra?

Quero as três pontas deste T encravadas nesta pedra, uma abertura gigantesca, mas finita, deve ter fim, impossível o que não tem.
Afiarei com o I até ver brilhar a última partícula de metal, se houver metal. Pode ser até que se reduza a pó este I, agirei com muita força. Quero a desgraça do I e a ditadura do T.
Permita-me, quero dois Ts, assim serão seis pontas, mais do que perigosas...Quando for o momento, por favor, segure meus ombros. Pobre de minha fraqueza que quer agir com arrogância.
Pouco menos que uma formiga em cima daquele peso, mas as batidas serão contínuas como se fossem os ponteiros do maior relógio do mundo. As horas cessarão quando do fim do tempo, meu movimento terá o mesmo destino. Eu que pouco suporto essa palavra.
Quero que cada estalar penetre como frio na barriga, que provoque enjôo, que cause desmaio, estale os ouvidos com veemência.
Necessito que meus braços não agüentem mais, por favor, segure meus ombros. Farei dessas pontas partes de mim, assim serei um pouco do T e ele um pouco de mim. Essa letra-faca terá veias, mas não deixarei que por ela escorra meu sangue, porque ele tem costume de ser quente. Minha fraqueza quer agir com inocência.
Pancadas. Não quero que os Ts se quebrem.
Pancadas. Não quero que os Ts se cortem.
Pancadas. Meu coração estará literalmente amarrado e torcido nos dois Ts. Eu perfurarei na dureza absurda. Ela irá latejar.
Violência? É a existência camuflada, fria e dura dessa pedra redonda que chamam de Terra. Agressividade?
É sua ignorância. Você aceita e eu queria ser você. Mas sou ignorante também, reflita sobre minha pretensão.

Não gosto de pensar no infinito, torno-me mais ignorante. Não gosto da fraqueza que me redime. Mas mudo muito e quero furar, perfurar, “descamuflar”, rasgar, penetrar para ver se faz sentido.
É oca a Terra? Quero as três pontas deste T encravadas nessa pedra.

Adeus

Às vezes fico pensando como ficam pensando que nos despedimos do mundo. Às vezes uma fatalidade pode arrancar uma vida, um filho que passa pela porta e nunca mais volta, um avião derrapa na aterrisagem, uma vela que apaga antes da hora. Ou não se apaga, cai no tapete acesa, e o bebê está dormindo.
Imagino como fica uma mãe que acabou de brigar com esse filho; um pai que acabou de se recusar ir assistir ao bebê para velar seu sono; um casal que acabou de terminar o relacionamento pela distância, e ela está voltando para seu país com uma passagem só de ida. Esse é o problema. O problema é quem fica. Uma culpa que não os pertence vai possuir seus corpos e suas almas de forma incomensurável. Uma culpa que é a verdadeira culpada, por simplesmente existir.
Aos que escrevem, resta uma luz. É como uma indulgência eterna - enquanto dure. A estes, que ousam tornar estáticos sentimentos que nem ao menos se sabem cíclicos, que utilizam símbolos para substituir dores, onde a dor e a felicidade é simbolizada por palavras vis - e muitas vezes rebeldes-, resta sempre se despedir. Não é justo, mas é o que se pode fazer. Os americanos não têm a palavra "saudade" em seu dicionário. Os escritores americanos não sentem saudade?
Para que, quando o mundo não suportar mais a minha raça, tudo se dissolva, recomendo a todos que, sempre que escreverem, soarem tristes. Sempre uma despedida. Será que qualquer espécie de registro deveria sempre conter uma mensagem de adeus? Ou um pedido de desculpas?
O ser humano fica mais inteligente quando fica quietinho, meditando, porque ele cresce por dentro. Essa história de modernização e tecnologia só estraga tudo. O ser humao cresce mais e evolui quando não se mobiliza para tornar o mundo melhor para viver. Às vezes o melhor para o mundo é o próprio mundo, e não o ser humano.

ELE EM MIM

Cá estou
Como o mundo
Devastado, tentando respirar
Ex
Pirar?

Cá estou
Como o mundo
Explodindo aqui e acolá
In
Terno?

Cá estou
Como o mundo
Contente por ainda me preservar
Con...
Tento?

Cá estou
Como o mundo
Cheio de combustível nuclear

Postos?

"Ter" virou mania
"Ser", claustrofobia

Sou um interruptor
Exquisito
Esquecido
E vivo

(In) feliz?
(In) sensível?

Inconseqüente-mente... para mim

De repente, alegro-me ao receber notícias tuas
- de repente triste -
eu, que poderia amar, entre tantas criaturas,
a modelo, a cantora, a atriz
impus a mim mesmo essa cruz
(o amor é prata que reluz)
Amo-a, e desperdiço a chance
de ser feliz
Ao beijar uma boca - que não a tua
o corpo inteiro em estado de emergência
avisa a mente: Perigo! Mas pobre
alma tola diante da pele nua
de outra
bela jovem, maior estatura
- sem julgar só pela aparência.
Perigo? Oh, santa paciência!
Esse Amor desprovido
de toda Razão (flutua)
ignora que o risco seja
viver contigo - e jamais tê-la conhecido
ainda que leve, bela, livre... viva nua!

Às tantas naves que levam tantos sonhos

Mingua, menina
Saudações ao céu
No quase beijar as estrelas
Foste ao abraço
Mingua, menina
Um caloroso adeus a quem deixaste
Vem, vem
Vão

terça-feira, julho 17, 2007

_
Pensar é penar
No entanto tento
Entretanto penso
Entra tanta coisa
Entre tanto tempo
Entretanto lá:
Mentos! Masco e penso:
Pra que tanto tento?
Vou ficar tantã
Se é que já não estou

Talvez quando estiar
E este ar secar
Eu vou melhorar
Eu vou mergulhar
Noir
A partir
Do vigésimo
Quinto andar
Quem sabe então
_______________v
________________ô
_________________o
__________________u
__________________u
__________________u
__________________u
__________________u
__________________u
__________________u
__________________u
__________________me
__________________llorar

Quem sabe então vou melhorar
Quem sabe então vou me olhar
Quem sabe então vou memorar.
Quem sabe então vou me morar.

Lágrima

Eu quero uma lágrima para cada árvore derrubada. Eu quero que, para essa foz de choro, um raio solar que atravesse o maior buraco da camada de ozônio faça evaporar toda essa água.
A metade que foi para o céu, quero que caia sobre cada ex-árvore, fazendo-as renascer, crescer, e que todos os primeiros chorões se emocionem novamente, para que sempre chova e nasça mais e mais árvores. Quero também que todo o sal decante nos oceanos, e que cada grão caia dentro de uma concha.
Quero que cada uma dessas ostras faça a mais bela pérola de sua vida, e que as marés as levem para as mãos de quem merece - e precisa. Quero que hajam tantas pérolas para que o próximo astronauta que ousar dizer a cor do meu planeta alegue que ele é cintilante como a Lua. Aí saberei que, na verdade, para o meu contentamento , a Terra está tão cheia de vida como o brilho da Lua.
Quanto ao buraco, quero que fique lá. Ao menos servirá de lição. E para a Lua poder ver de camarote o meu sonho.

Um dia após o outro

Estava cheio dessa imundice que chamam rotina. Oh, traje diário! A rotina, que vestia como um moletom puído. Se tentasse passar três dias sem encarar a si mesmo no espelho... crescia barba. De resto, nem um pêlo a mais como novidade – no máximo um fio de cabelo ou outro, caía vez ou outra, mas era tão assim como descrito, que ele simplesmente olhava... e não enxergava que era dele. Pensava até que aquilo era a vida de alguém que lhe havia surrupiado o corpo para moradia, um parasita fantasma mal-resolvido com o marasmo da Terra; um imbecil apegado às coisas mundanas – patético! A ele, a quem ainda não havia sido dada a chance de morrer, cabia suportar o peso da alma de outro. Dessa consciência brotou uma empatia tal que o fez acender um charuto pela primeira vez. A primeira vez em trinta e sete anos - era tudo o que tinha. Sentiu que o outro se aliviara por instantes. Pequenos incentivos ao vício extraterreno, devia ser pecado, mas fazer o quê? A criatura emanava desejos quase obscenos. A cervejinha dos finais de semana fora substituída por um uísque noturno, soma-se a isso o fardo rotineiro: todas as noites um trago – exigência do mundo de lá. Um carteado para acompanhá-lo na humilde tentativa de distrair as horas. Traía a si mesmo. Apostava de vez em quando, perdia tudo – voltava para casa troteando entorpecido, e resmungava que o outro era muito ruim de jogo, que viveria morto miserável para sempre. Caminhava tropeçando nos ladrilhos tortos a caminho de casa, ignorando que a solidão fosse a única coisa a ouvi-lo. Ele quem? Ele estava ali dentro do corpo apertado, sentindo o hálito alcoolizado do falecido. Perguntou seu nome: nem um grunhido. Apelidou-o de Venâncio, mas sempre esquecia e o chamava de Aroldo. Certo dia, eram oito horas da manhã de domingo, eles ainda não haviam chegado em casa, os dois cantarolantes pelas ruas, pensou: esse é o meu camarada... Zeca! Mas qualquer que fosse o nome dado, esquecendo-se ou não, o fato é que estavam cada vez mais íntimos – casados: dormindo e acordando juntos?! Era melhor parar, parar de alguma maneira repentina. Que Venâncio era viciado em drogas e ele, por sua vez, era viciado em Venâncio. Decidiu tentar esquecê-lo: cerveja em vez de uísque; charutos não mais: cigarros. Era um tapa na rotina: ainda ia para o bar, mas era um botequinho sem frescuras, perto do terminal de ônibus – se voltasse a pé, temia dar de cara com o outro, que bem conhecia o caminho. Jogava dominó, ouvia música sem cantar – acreditava que o canto atraía os mortos para o lado de cá. Venâncio havia comentado sobre o permanente silêncio à sua volta. Pobre coitada alma penada! Era por ele que fazia isso, para libertá-lo procurava agora não reencontrá-lo. Mas - desconhecia o motivo - certa vez, acordou adoecido. “Deve ser a saudade...”, cogitou consigo. Internou-se em uma clínica, temendo que em sua casa o outro pudesse aparecer qualquer dia – era tão imprevisível! Recebeu, entretanto, a única visita de uma cristã que falava sobre a importância da vida, de qualquer vida, até mesmo a dele. Recusou ouvi-la. Vinham à mente lembranças do outro. Obteve alta em seguida – a enfermeira comovendo-se deixou escapar duas palavras: “pouco tempo”. Mas ele quase não ouvia nem dizia... Tão Ignorante de tudo, impregnado no cotidiano, esqueceu de respirar. Há quem diga ter sido proposital: suicídio. Quem sabe? Ele não sabia de mais nada. Chegou do outro lado e, por falar nisso, conheceu tantos Venâncios, Zecas e Aroldos, que os chamou de Liberdade. Mas - que nada! - eram vícios.

Ao vivo #2

A mesma necessidade de escrever.
A mesma ansiedade por leitores,
palavras em aparecer.

Segunda-feira-noite,
hora de expelir jóia brilhante,
pedra bruta, ou rocha arenosa
que se desfaz em pouco tempo
ou sopro pequeno .

A mesma ansiedade em palavras.
As teclas cedem macias,
mas as mãos sentem falta do papel:
e dos erros
e das rasuras
e garranchos

...a mão esquerda só a segurar a folha
...os olhos a mirar as rachuras
...o grafite derretendo no papel



p.s.: [é gus, às vezes só ao vivo! abraço!]

domingo, julho 15, 2007

Tudo bem,
não creio em Deus.
Mas creio na divindade e
no mistério da vida.
No milagre da vida.

E como não crer?

Divindade sem Deus?
Divindade também é perfeição.
Simplesmente perfeição.
A natureza é perfeita.
Misteriosa.
Milagrosa.

A perfeição requer um criador?
Talvez.

______________Mas o criador também não requer um criador?

Por que o mistério tem de estar nele, não em nós?

Se Deus é o todo, eu sou Deus.
Princípio auto-criador.
Todo contido na parte.
A flor na semente, a semente na flor.

Nesse caso,
louvar a Deus é
reciclar seu lixo
sem esperar por isso
um quarto com frigobar no paraíso.

(entre outras coisas)

Duvidar do milagre é duvidar da vida.
Nunca duvido.
Mas o milagre é a natureza.
O milagre é natural.
O que é sobrenatural
não é milagre.
É mentira.

Duvidar de Deus é duvidar do homem e
isso me parece um tanto quanto necessário.

Ser ateu é assumir a responsabilidade
de também ser Deus.

Ser ateu é saber-se eterno.

Prosseguir no verme,
germe da vida.

Tornar-se terra, semente, flor.

sexta-feira, julho 13, 2007

Dia de Cão

Tá na pior
Tá na sargeta, às escuras
Tá com nada,
Tempo tem pra acalmar qualquer fissura

Desce a ladeira
Pois tá sem eira nem beira
Bate toda essa poeira
Ainda é segunda-feira

Cai a tardinha
Toma todas, vai pra casa
Bate o carro na pracinha
Já tá expelindo brasa

Pega um cigarro
E o maço tá sem cigarro
Fumou tanto, deu pigarro
Tosse tanto
Sai catarro

Chega uma carta
Com uma ordem de despejo
Faz um último desejo
Olha pra cima e infarta

(10/05/2006 - E ainda persiste)

quarta-feira, julho 11, 2007

A paralisia, que me é imposta quando o mundo gela, faz com que meus movimentos sejam pesados e pálidos. O inverno sempre se aproxima primeiro e todas as noites é necessário pousar as mãos sobre o lado esquerdo do peito para lembrar que ainda há vida.
Então o gelo liquidifica-se como um eclipse solar. Quando acontece é tanto contentamento que se pode dormir descoberta. Livre. É tão raro que penso em comprar lenhas eternas para acender uma fogueira, daquelas de festa junina. Seria tanta felicidade que entenderia Vinícius de Moraes e o poeta me aqueceria com leveza.
Muito difícil dormir depois que se sai da placenta. E a primavera e o outono apenas enganam o coração. Quase sempre se precisa das mãos, mas às vezes até elas congelam e, urgentemente, clama-se por fogo.

Amálgama

Não te amo porque és belo
Ou carinhoso
Ou honesto
Ou simpático
Amo-te por causa dos dias de sol
e céu zul
Em contraste com os períodos de chuva
frio e caos
Amo-te pela barba mal feita pela manhã
rosto, boca e pescoço
- Ai, ai, ai!
Amo-te pelos dedos na nuca arrepiando
- Ui, ui, ui! Tô amando!
Amo-te pelas horas em silêncio e companhia
O sono perturbando a madrugada
Amo-te pelos pêlos por entre as pernas
O sigilo, o segredo, os sonhos
e as realizações
O fingimento, a força, a fidelidade
e suas limitações
Amo-te, ai, mais
muito mais
que meu raciocínio é capaz
de compreender
Tarde ou cedo
- Ui, que medo!
Alguém descobre o meu segredo
- Onde? Quando? Por quê?
Transfere pro meu dedo
as tuas marcas digitais
trans... fere
trans... fusão
trans... comigo?
- É cedo, é cedo...
Amo-te por isso e por aquilo
que não se explica
E as contas pra pagar, parceladas
O sofrimento, a dívida
Amo-te pelo filme com pipoca
Brigadeiro na panela e Coca
- Atende a porta!
- Deixa tocar, deixa tocar...
Amo-te pelo resfriado manhoso
(uma vez por ano)
O banheiro perfumado depois do banho
(encharcado!)
Amo-te porque és finito em tua plenitude
Confuso em tuas atitudes
Decidido em tuas manias
- Mais um final de ano...
- Saúde!
Amo-te, enfim, quem imaginaria
que por ti morri
morro
morrerei
morria
...?

post-it pra próx. vez

as pessoas têm medo de se machucar, umas têm medo de causar sofrimento alheio tanto quanto em si mesmas.
como numa brincadeira, cada um sabe seu papel naquele ambiente, naquele momento, naquele relacionamento. Uma realidade temporária criada em comunhão, não tenha medo de se machucar. O medo limita seus sentidos, seus sentimentos e pensamentos.
o verdadeiro sofrimento não está em emoções limitadas àquele contexto. No fim do dia, no fim da noite, qdo a festa acabar, esse pequeno sofrimento já virou passado, cicatrizado e superado. Sofrer é querer continuar na dor, não desabar as lágrimas que aliviam, não gritar as palavras que exorcisam a raiva, menosprezar o poder do auto-perdão, desvalorizar sua força e a de todos, não tenha medo de machucar os outros.

domingo, julho 08, 2007

Difícil

Difícil é
Ser sendo
A soma de
Tudo que é
Nulo

Ser
Car.

Ser
Cear

Ser
Pejar

Ser
Pentear.

Difícil
É
Ser sendo
O supra
Sumo do
Ab
Surdo
E ficar
Assim:
Irresoluto.

Contra o luto, lutando.
Contra a fome, fumando.
Contra a vida, vivendo.

Mais difícil
Que isso
É ser Veja.

Difícil é
Se parar.
Difícil é
juntar.

Difícil é
saber se
canalha.

É saber
Se na vala,
Valador!
É saber
Se velado,
Vela dor.

Preso
Na
Nau
Nauseado

Preso
Na
Nau
Naufrangado

Tão
Lenta
Mente.

Difícil é
Saber se em
Cerrado.

É saber-se
enjaulado,

Enjaula dor.

Estrangula dor!

(- Por que
Tenta dor?
Pra que
Tanta dor?

- Desculpe
É minha
Língua!
(mal) criada
Pelo
Domina
Dor).

sábado, julho 07, 2007

Fato

Ontem um amigo dormiu em casa. Meu melhor amigo. Estava um pouco triste com o término de seus longos dois anos de namoro. Fui dar um ombro. No dia seguinte, como trabalhamos relativamente perto, pegamos o mesmo ônibus. Dentro do transporte coletivo, já sentados em seus respectivos assentos:
- Léo, eu falo muita merda?
- Como assim? Não. Por quê?
- Não. É que eu estava pensando que as vezes eu falo merda demais. Será que as pessoas se afastam de mim por causa disso?
- Ah, pára Gus! Se fosse assim as pessoas não iriam continuar te chamando para sair!
- É verdade. Mas que eu falo muita merda, isso eu sei que falo.
- Mas são merdas que as pessoas não ligam de ouvir.
- É pode ser. Eu tenho um pouco de medo de não gostarem de mim e só fingirem que gostam...
- Ah, não fala merda, Gustavo!

quinta-feira, julho 05, 2007

Delírio Fúnebre

Quase escuto teu passo
descom-
passado
Imitando o andar
sei lá de quem
- algum famoso
empoeirado -
Sinto por dentro
senti-
mento
de ver chegar alguém
Em todos os instantes
guardados na estante
da memória,
confunde o pó a brancura
dos teus olhos mornos,
teus olhos mortos.
O que me envelhece a alma:
a amarga ironia
de que só te dei flores
nessa hora.

quarta-feira, julho 04, 2007

Eu sei de tudo

Se quando digo que vai esfriar, você logo diz não
Se imploro por um beijo, enche logo a boca de feijão
Faço dois cheques de 200 pra você ir ao salão
Já até subi num touro pra te impressionar
Caí no chão

Vive com dores de cabeça toda noite há um tempão
Não posso ousar chorar que logo inverte a situação
No seu diário leio sobre toda a sua traição
E me devoro todo pra deixar inteiro o meu perdão

Levo café na cama e você diz que não come mamão
Durmo no pé da cama pra te proteger como seu cão
Tenho que comprar jóias pra te deixar louca de tesão
Sirvo de bode expiatório dessa nossa relação

São tantas negligências como a blusa ainda sem botão
À noite noto sua ausência ao meu lado no colchão
Te vejo andar na praça de mãos dadas com um capitão
Pra consolar cometo adultério com meu violão

terça-feira, julho 03, 2007

[16 - parte 2] Vontade de ser Deus

Supondo que Deus exista, e como afirmam: somos filhos dele. Logo, além de herdarmos uma fração de poder infinito, herdamos a sua vontade de criar.

Modificar o que está em volta, erguer construções 100 vezes maiores e mais pesadas que nós, construir ferramentas que amplifiquem nossas capacidades físicas. Feitos grandiosos, não residiria aí um desejo de se tornar um deus?
Poder para criar e destruir, acima da vida e da morte. Controle total sobre vidas, simular realidades, desenhar outros universos. Até onde podemos ir?

Temos todo esse poder, uma espécie que engaja tempo e esforço para destruir os mesmos de sua raça, e que vê em números e papéis verdes a salvação. Podemos continuar infinitamente ou perecer sob nosso próprio ego.

Bobagens importantes para o meu bem estar individual

Tenho meus hábitos
Meus jeitos
Minhas coisas, manias

Tenho meu hálito
Meu peito,
Minhas prosas, melodias

Tenho atitude
Amor próprio, orgulho

Tenho minha idade,
Meus átrios, ventrículos
Pulsantes

E veias
Tenho veias
Forradas de vida, de gente, de histórias
Em cada uma transbordo células e organelas

No meu DNA está escrito
Em cada gene, como estou
Como sou, como penso

E por isso, neste momento,
Estou simples
Não composto

E o cross-over?

Tuinha

Tuinha
Tu, ´inda fazes "nhé"
Tão claramente
Tão francamente
Tão "inha"

Tuinha,
diminutivo gracioso de ti
De tu, pequenina
Grande Tu - inha

Se tu vinhas
Com cores das minhas
Aromas
De tulipinhas
Ficaria todo lambuzado
De flor e carinhos

E se tu vinhas
Com sabor
De uvinhas
Com asas
De andorinhas
Ficaria todo colorido
De tintas vinhas
De vinhos tintos
De tantas que tinhas
Tuinha

(para alguém que já pensei ser mais que alguém, e que hoje nem sei mais quem é)

domingo, julho 01, 2007

Estou encharcada desde o momento em que meu corpo deixou de ter contato apenas com o ar que respiro para atingir a dimensão de um líquido. E a água se esparramou por toda a minha superfície de pele.
Concebo agora o que é, por natureza, desfeito. Em mim o palpável bóia. Já não percebo muito do mundo, vejo que gotas espirram para fora de meu corpo. Já não tenho mais o interior e o exterior, tudo é líquido e se apresenta como tal.
O vento me atinge a todo instante e temo e tomo qualquer forma a todo o momento. Penso que ele tem a intenção de me refazer como gente, ele quer ser respirado (ou está só brincando comigo) e não faço idéia de meus desejos.
Se eu cair agora dentro de um emaranhado de água, não serei mais perturbada pela atmosfera humana porque, quando criança, aprendi a nadar e mergulharei bem fundo até tatear algum sólido e me agarrar a ele. Que forma irei obter?
Estou é disforme, pouco me sustento na vertical. Na maioria do tempo locomovo-me feito poça d’água. Meu colchão e meus lençóis amanhecem completamente umedecidos, meu travesseiro também. Nele eu preciso apoiar aquilo que eu considero que seja minha mente, assim posso ter a impressão de que sou ser racional.

Seu eu chorar agora, ninguém vai notar.

Amanhã, quando acordar, quero ser gás para que o mundo possa penetrar em mim com maior facilidade. Quero ser em todos os estados – pois já tenho um anseio! Desta vez não terei forma alguma, não sei se precisarei ter receio de algo, serei seca e imperceptível.
Quando criança, não aprendi a voar. Não quero ser uma gasosa terrestre, será este um problema que terei de enfrentar em meu próximo estágio de existência? Que seja.
O papel está fragilmente molhado, já não posso mais escrever. De nada adiantou ter sido sólida e depois líquida, devo estar brincando com o meu próprio ser. Vou até a piscina, volto a escrever quando gaseificada.