São Paulo é um pântano cheio de crocodilos. Cidade-pântano, pântano quente, uma panela fervente de lodo, suor, concreto e sangue. Fora um dia a terra da garoa, hoje é a cidade-fornalha, dos dias quentes e melecados que deixam a cara imunda no fim do dia, dos temporais transbordantes que transformam o gigante de concreto em uma colossal piscina de água suja, lixo e urina de ratos. São Paulo, cidade-frigideira, das chuvas ácidas caindo torrenciais sobre o asfalto incandescente, evaporando e produzindo aquele bafo quente que nos deixa a impressão de se estar lentamente cozinhando no vapor. Crocodilos no vapor.
Os crocodilos são a espécie dominante
São Paulo é a cidade do enfrentamento. Os crocodilos enfrentam os humanos, é claro, mas também se enfrentam entre si, os humanos se enfrentam entre si, todo mundo enfrenta todo mundo e, além disso, os humanos têm sido cada vez mais confundidos com crocodilos, tanto quanto os crocodilos com humanos, e por isso já não se sabe mais quem é o que, quem é quem, o que é o que ou qualquer coisa assim. È uma bagunça do cacete. São Paulo é uma cidade em guerra, ou melhor, uma cidade
São Paulo é a cidade-sexo, cidade-drogas, cidade moralista, paradoxal, cidade-clichê. Cidade das putas, dos travecos, dos drogados de todos os tipos, cheiradores, maconheiros, beberrões, os pedreiros do crack, a galera da balinha, a criançada da cola, cidade-leseira. É a cidade das bocas, nem mesmo o DENARC ousa fornecer um número estimativo sobre a quantidade de pontos de venda de drogas na metrópole. É a cidade dos puteiros, de luxo ou boca de lixo, todos os tipos. Cidade-foda. O sexo pulsa enjaulado em pequenos inferninhos espalhados pela cidade, nos banheiros da baladas, nas noites escuras no Parque Ibirapuera, nas elegantes casas de swing freqüentadas pela alta burguesia, nos karaokês da Liberdade, nos bailes funks da periferia, nas ruas que cercam o Jockey Club, lotadas de travecos, nos inúmeros terrenos baldios aonde abusadores levam suas vítimas, no entorno do parque Trianon, cheio de meninos fortes de braços a mostra, na Cracolândia onde crianças sem-teto transam chapadas de cola e pedra, no centro antigo com suas putas velhas e novas - gaúchas, goianas, mato-grossenses, catarinenses, paraenses, chinesas, tailandesas, multinacionais - em todo e qualquer maldito pedacinho. O sexo se esgueira por todos os cantos mal iluminados e mal-cheirosos, sempre fetichista, maluco, doente, reprimido, transbordando dos corpos falsamente tranqüilos das pessoas que trabalham pensando em sexo, mas trepam pensando no trabalho. Toda cidade tem sexo, mas é que
São Paulo é a cidade-cobiça, cidade-luta, cidade-trapaça, cidade-rancor. Fábrica de loucos, para ser bem clichê. E nós, é claro, somos só mais uns deles. Não sei se somos crocodilos ou humanos, sei que somos paulistanos. Percebi a rima bobinha, mas decidi deixar ficar. É uma cidade tão feia, tão suja, não sei como gosto tanto, mas é uma cidade tão feia, um começo tão idiota para uma história tão banal, por que não manter a rima boba? Deixa essa merda aí. Foda-se!
7 comentários:
Está aí uma rábula bem conseguida.
Que pena, para uma cidade tão bela, como deveria ser essa!
Um abraço
pelamordedeus, que seja o 1o. de mtos capitulos!
Gênio!
Caito, há quanto tempo, n "via" vc.
:)
Adorei esse texto.
Se eu tivesse alguma intenção em ir nessa cidade, mudaria de opinião. eheheh
Eu vivo numa cidade de 30.000 habitantes, em q por enquanto, ainda posso sair à noite sózinha sem ser incomodada.
bjs daqui
a.
Rapaz! Maravilha de texto!
Faço coro ao que diz o hi-fi, que venham mais capítulos!
Eu ainda tenho o ideal de Sampa cantada por Caetano...
Mas não se pode negar os rumos que as grandes metrópoles seguiram e onde estão chegando
Que venham os próximos capitulos!!!
Até eu que leio tudo e nunca comento nada não pude ficar calada perante esse texto. Você brilha, amor!
Gênio! (2)
*São Paulo te amo, São Paulo te odeio.
Um brinde a nossa cidade foda-se.
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